PROVIMENTO N.° 17, DE 22 DE MAIO DE 2018.
Dispõe sobre a averbação da alteração do prenome e do gênero nos assentos de nascimento e casamento de pessoas trans no Registro Civil de Pessoas Naturais.
O CORREGEDOR-GERAL DA JUSTIÇA no uso de suas atribuições legais e regimentais;
CONSIDERANDO o poder de fiscalização e de normatização do Poder Judiciário dos atos praticados por seus órgãos (art. 103-B, § 4o, I, II, III, da Constituição Federal de 1988);
CONSIDERANDO a competência do Poder Judiciário de fiscalizar os serviços de registro (arts. 103-B, § 4°, I e III, e 236, §1°, da Constituição Federal);
CONSIDERANDO a competência do Corregedor-Geral da Justiça de editar provimentos e outros atos normativos destinados ao aperfeiçoamento das atividades dos serviços de registro;
CONSIDERANDO a obrigação dos registradores em cumprir as normas técnicas estabelecidas pelo Poder Judiciário (arts. 37 e 38, ambos da Lei n. 8.935, de 18 de novembro de 1994);
CONSIDERANDO que a legislação internacional de direitos humanos, em especial o Pacto de San José da Costa Rica impõe o respeito ao direito ao nome (art.18), ao reconhecimento da personalidade jurídica (art. 3o), à liberdade pessoal (art. 7.1) e à honra e à dignidade (art. 11.2);
CONSIDERANDO que a República Federativa do Brasil é Estado signatário da Convenção Interamericana de Direitos Humanos, cujos dispositivos devem ser observados sob pena de responsabilidade internacional;
CONSIDERANDO o direito constitucional à dignidade (art. 1o, III, da CRFB), à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem (art. 5o, X, da CRFB), à igualdade (art. 5o, caput da CRFB), a identidade ou expressão de gênero sem discriminações que abrange;
CONSIDERANDO o julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n ° 4275-DF, em 01/03/2018, que reconheceu o direito dos transgeneros, que assim o desejarem, de substituírem o prenome e sexo no registro civil, diretamente em cartório, sem a necessidade de prévia cirurgia de redesignação sexual;
CONSIDERANDO o que restou decidido nos autos do PROAD n.° 201804000088543.
RESOLVE:
Art. 1o A alteração do prenome e do sexo do transgênero pode ser solicitada diretamente ao Registrador Civil das Pessoas Naturais, mediante requerimento em que conste a auto declaração de sua identidade de gênero, independente de prévia autorização judicial ou da comprovação de realização de cirurgia de redesignação sexual e/ou tratamento hormonal ou patologizante, assim como de apresentação de laudo médico ou psicológico.
§ 1o O registrador deverá proceder à identificação da pessoa requerente, mediante coleta, em termo próprio, conforme modelo constante no Anexo I, de sua qualificação e assinatura, além de proceder à conferência dos documentos pessoais originais.
§ 2o A solicitação será feita preferencialmente pelo próprio interessado, sendo admissível se fazer representar por mandatário constituído, desde que por instrumento público com poderes especiais, descrição das informações essenciais e prazo de validade de 30 (trinta) dias, perante o Registrador Civil de Pessoas Naturais, na presença do qual deve firmar o requerimento de alteração com firma reconhecida em cartório na modalidade “por autenticidade”.
Art. 2o A pessoa requerente deve apresentar, no ato do requerimento, os seguintes documentos:
I. certidão de nascimento atualizada;
II. certidão de casamento atualizada, se houver;
III. cópia do registro geral de identidade – RG;
IV. cópia da identificação civil nacional-ICN, se houver;
V. cópia do passaporte brasileiro, se houver; VI. cópia do cadastro de pessoa física perante o Ministério da Fazenda-CPF;
VII. comprovante de endereço;
VIII. certidão negativa do distribuidor cível de todos os Tribunais (estadual e federal);
IX. certidão negativa do distribuidor criminal de todos os Tribunais (estadual e federal);
X. certidão negativa de execução criminal de todos os Tribunais (estadual e federal);
XI. certidão negativa de tabelionatos de protestos do local de residência dos últimos 5 (cinco) anos, SPC e SERASA;
XII. Certidão de quitação eleitoral;
XIII. certidão negativa da justiça do trabalho de todos os Tribunais. XIV certidão negativa da justiça militar, se for o caso;
§1 ° A falta de quaisquer dos documentos listados no parágrafo anterior impede a alteração pretendida.
§2° A existência de ações em andamento ou débitos pendentes, nas hipóteses dos incisos VIII ao XIII deste artigo impedem a alteração pretendida.
Art. 3o A alteração será averbada à margem do livro do último e atual registro civil do(a) requerente, nos termos do artigo 97 da Lei 6.015/1973, com as alterações da Lei 13.484/2017, devendo ser estendido aos registros anteriores por meio de anotação/averbação ou comunicação prevista no artigo 106 da Lei n° 6.015/73.
I – se o(a) requerente não souber ou não puder assinar, terá que comparecer 1 (uma) pessoa que assine a seu rogo e 2 (duas) testemunhas para o ato.
II – na impossibilidade de comparecimento pessoal, por inviabilidade de locomoção ou outro motivo que não altere sua livre manifestação de vontade, o registrador ou seu substituto pode comparecer no local em que ele se encontra, respeitados os limites territoriais que definem sua competência.
Art. 4o O requerente é livre para escolher o registrador civil, no âmbito do Estado de Goiás, independente de ser o do local de seu nascimento, casamento ou de sua residência.
I – Quando a solicitação for feita perante registrador diverso daquele em que o(a) requerente foi registrado(a) quando de seu nascimento ou casamento todos os documentos apresentados serão digitalizados e encaminhados de forma eletrônica ou física de um registrador civil ao outro, vedado o intermédio de terceiro.
Parágrafo Único. Após o deferimento do pedido, o Cartório ainda comunicará a respectiva modificação à Receita Federal – RF e à Central de Informação do Regsitro Civil – CRC, a alteração dos dados juntamente com o número do Cadastro de Pessoa Física – CPF, para que proceda à averbação.
Art. 5o Toda pessoa capaz na forma da lei poderá requerer perante o oficial do Cartório do Registro Civil das Pessoas Naturais, a averbação do prenome e do gênero, a fim de adequá-los à identidade auto percebida.
Parágrafo único. A averbação referida no caput será irrevogável, somente podendo ser desconstituída pela via judicial, e não abrange a alteração dos nomes de família.
Art. 6o Os portadores de deficiências auditiva, de fala e/ou visual, que necessitarem, devem ser assistidos por tradutor ou intérprete da Língua Brasileira de Sinais (Libras), o qual deve apresentar além do documento de identificação, seu certificado ou habilitação emitidos pelas instituições competentes.
Art. 7o Finalizado o procedimento de alteração no assento, a pessoa requerente deverá providenciar a alteração nos demais registros que digam respeito direta ou indiretamente à sua identidade, além de seus documentos pessoais, sendo que ainda que o (a) requerente utilize certidão de casamento, é obrigatória que a alteração se estenda até o seu Registro de Nascimento.
Art. 8o O registrador perante o qual houve o comparecimento, bem como aquele que realizar as anotações/averbações, manterá em arquivo cópia eletrônica ou física de todos os documentos apresentados, encaminhados e/ou recebidos.
Art. 9o A certidão a ser emitida não mencionará o conteúdo da averbação, resguardando o sigilo da alteração levada a efeito.
§1° No campo observações, deve ser feita somente menção à existência de averbação à margem do termo, sem especificar o seu conteúdo, com a seguinte inscrição: “a presente certidão envolve elementos de averbação em caráter sigiloso”.
§2° Quando for a pedido do(a) requerente pode ser emitida certidão em inteiro teor contendo a averbação, sem necessidade de determinação judicial.
Art. 10. Serão emitidas certidões de inteiro teor de registros de nascimento ou casamento que contenham averbação objeto deste Provimento quando solicitada pessoalmente pelo(a) registrado(a) ou por mandatário constituído, nos termos do § 2o do Art. 1o.
I – A solicitação da certidão em inteiro teor se dá mediante requerimento firmado pelo(a) registrado(a) com firma reconhecida em cartório e cópia do seu documento de identificação.
II – O fornecimento de certidão de inteiro teor a terceiros depende de autorização judicial.
Art. 11. O(a) requerente deverá declarar a inexistência de processo judicial que tenha por objeto a alteração da identidade de gênero, sob pena de incorrer em ilícito civil e penal.
Parágrafo único. Quando houver processo judicial em andamento, a opção pela via administrativa está condicionada à comprovação do seu arquivamento.
Art. 12. É vedada aos oficiais registradores a recusa imotivada à alteração solicitada, caso sejam cumpridos todos os requisitos do presente provimento.
Parágrafo único. A recusa imotivada deve ser comunicada pelo(a) interessado(a) ao diretor do foro competente, nos termos da legislação local, para as providências disciplinares cabíveis.
Art. 13. Os registradores deverão observar as normas legais referentes à gratuidade de atos, estabelecidas por lei estadual de emolumentos.
Art. 14. Na impossibilidade de manifestação válida de vontade do(a) requerente a alteração deverá ser pleiteada na via judicial.
Art. 15. Suspeitando de fraude, falsidade, má-fé, vício de vontade, simulação ou quaisquer outras dúvidas sobre o requerimento de alteração do registro, o registrador não praticará o ato e, fundamentando a recusa, encaminhará o pedido ao Ministério Público, dando ciência ao Diretor do Foro.
Art. 16. Este procedimento entrará em vigor na data de sua publicação. Publique-se.
Goiânia, 22 de maio de 2018.
WALTER CARLOS LEMES
Corregedor-Geral da Justiça
(assinado digitalmente)