Há casos em que a criança não é registrada porque a mãe também não tem o registro civil de nascimento
Em 2015, o Brasil declarou o fim do sub-registro civil. O Ceará, entretanto, não se insere nessa condição. Conforme levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nascem por ano, somente em Fortaleza, 42 mil bebês, dos quais 1.800 (4%) não são registrados na Cidade.
Apesar dos esforços de órgãos públicos e organizações não governamentais, a erradicação do sub-registro civil de nascimento no Ceará ainda é uma realidade não alcançada. Em Fortaleza, a situação vem avançando significativamente, em contrapartida aos problemas vividos de modo latente em outros municípios. Entretanto, novas ações e metas estão sendo estabelecidas para tentar diminuir cada vez mais este problema.
No dia 5 de julho último, foi homologada a Portaria Nº 56/2017, responsável por designar os membros representantes do Comitê Gestor Municipal de Políticas de Erradicação do Sub-registro Civil de Nascimento e Ampliação do Acesso à Documentação Básica. O comitê, segundo a Prefeitura, tem como finalidade planejar, implementar, monitorar e avaliar as ações, por meio de metas anuais, para a erradicação do sub-registro e ampliação do acesso à documentação básica em Fortaleza.
O Comitê foi criado, de modo oficial, em dezembro do ano passado, enquanto as atividades concretas da secretaria executiva foram iniciadas há dois meses. Dentre os recursos disponíveis com a criação do Comitê, está a de veículos para o acompanhamento das pessoas que necessitam fazer o registro de nascimento e a criação de um número 0800, onde equipes da Prefeitura atendem pessoas que pretendem emitir a certidão. Desde maio, 37 pessoas se cadastraram no sistema.
De acordo com Letícia Moreira, secretária executiva da Fundação da Criança e da Família Cidadã (Funci), o comitê está realizando, neste semestre, um plano de trabalho no intuito de construir um levantamento atualizado de pessoas não registradas na Capital. “Estamos fazendo esse mapeamento em parcerias com escolas, postos de saúde e outros programas, para fazer o levantamento dos usuários dos serviços públicos. Nosso objetivo é saber quantas crianças chegam para utilizar os serviços e que não possuem a documentação civil”. Segundo dados da instituição Visão Mundial, que compõem o Comitê, Fortaleza somava 6.509 crianças sem o registro civil de nascimento.
Letícia aponta que a meta é que o Comitê consiga, até o fim do ano, realizar 180 registros de nascimento em Fortaleza. O número foi estabelecido a partir de um cálculo com base no relatório do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2015, o qual aponta que, anualmente, nascem 42 mil bebês em Fortaleza. A secretária executiva explica que dessa quantidade, apenas 4% das crianças (correspondente a 1.800) não são registradas na cidade.
Letícia ressalta que, dentro dos 1.800, parte deles são moradores da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF) ou até mesmo de outros estados, no caso de pessoas que recorrem à Capital para realizarem o parto em situações de risco. O comitê estabeleceu que, do total, seria adequada manter a projeção dos 10%. Atualmente, a meta estabelecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) é que o índice de crianças sem o documento seja inferior a 5%.
Estado
Além do Comitê, outras ações estão sendo executadas com o objetivo de avançar no assunto. O Projeto Estadual de Erradicação do Sub-Registro Civil de Nascimentos, do Tribunal de Justiça do Ceará, mantêm um convênio da Justiça com cartórios para que, até em 24 horas após o nascimento, a criança possa ser registrada.
Onze hospitais de Fortaleza – além de outros 29 do Interior – já foram contempladas com o sistema de registro. Na Capital, apenas a Maternidade Sra. Juvenal Carvalho não recebeu o projeto, pois consta que a unidade foi desativada. Entre 2013 e 2015, o projeto já possibilitou que mais de 50 mil certidões fossem emitidas dentro nas maternidades. Apesar da capital registrar desempenho satisfatório, as comarcas de Interior seguem em contraste. Cerca de 53 municípios cearenses não receberam o projeto do TJCE, deixando a possibilidade de registro na própria unidade de saúde inviável. Dentre as alegações para a não instalação, são pontuadas a falta de interesse de cartórios em disponibilizar funcionários para se destacar até os hospitais, dificuldades técnicas e físicas, além da falta de convênio de algumas unidades com o Sistema Único de Saúde (SUS).
O TJCE afirmou que todas as comarcas receberam o Kit Cartório – com computadores e impressoras – e que participaram de reuniões com os cartorários no intuito de esclarecer que a ação seria positiva para todos os lados. No entanto, parte dos cartórios recusaram-se a disponibilizar equipes.
Conforme Roberto Soares Bulcão, mesmo com o registro nas maternidades, a persistência do sub-registro pode ser explicada por condições para além do registro na maternidade. “Em Fortaleza, temos o projeto implantando em todas as unidades. A criança que nasce em uma maternidade na capital já é registrada. A questão é que existem casos onde, por exemplo, alguém em situação de rua tem um filho. Se ela não tem registro, ela não pode registrar, então tem que ser adotado todo um procedimento para que regularize a situação das duas pessoas”.
Demora
Bulcão acrescenta que é necessário ter cautela durante esse processo, e que, por isso, o processo pode ser, por vezes, demorado. “Você tem que ter todo um cuidado para registrar essas pessoas, porque você não pode fazer isso apenas com os dados que ela repassa. Tem que verificar elementos que possam proporcionar um registro seguro, e isso demanda certo tempo”.
Letícia Moreira ressalta que, com o mapeamento e o apoio do TJCE, o Comitê pretende acompanhar as crianças que não realizaram o registro na maternidade, contactando as famílias e oferecendo- as a possibilidade de realizar o registro.